Wednesday, April 26, 2006

swazi, 2ª semana

Começo a ficar ambientado a esta santa terrinha onde não se passa nada. Parece que parte do meu mal-estar e cansaço crónico nos primeiros dias cá se devia há habituação do organismo à altitude. Pelo que me dizem, Mbabane tem uma cota de cerca de 1800 metros e na Ngwenya (lê-se “inguenha”) onde ficam as oficinas estamos quase a 2000. Parece que não, mas mexe com o corpo…
De manhã alteram-nos a hora de uma reunião com um potencial cliente e de repente ficamos com duas horas livres e nada para fazer! Resultado: fui com o Andrews (o tal swazi com sangue real) conhecer algumas peculiaridades de Mbabane. Daquelas que os estrangeiros (e muito menos os turistas) nem sonham!
Primeiro fomos ver o local onde está sepultado o fundador da cidade, o próprio Sr. Mbabane. Estava à espera de encontrar um monumento, mas não podia estar mais errado. No meio de um baldio está um amontoado de pedras rodeado de capim alto… é isso! O túmulo do fundador da cidade apenas têm uma velha, pequena e partida vedação a proteger (se estivesse inteira) um monte de pedras… ok…
De seguida fomos ao mystery pond! O mystery pond - manjolo fica num local lindíssimo nos arredores da cidade e é um local muito importante para um dos clãs fundadores da Swazi os Msibi. Os Msibi são um dos clãs Bantu que na sua fuga (difaqane) das barbáries do famoso Shaka dos Zulu (A.K.A. Shaka Zulu) se fixaram nestas terras. O pond (charco…) é importante para os Msibi porque é utilizado quando há disputas de liderança no clã. O funcionamento é simples, metem-se os dois candidatos com tochas acesas de um lado do manjolo (muuuuiiito fundo, pelo aspecto e pelo que me contaram penso tratar-se de um algar) e é eleito líder o que conseguir atravessar o manjolo (submersão total) e aparecer do outro lado com a tocha ainda acesa. Todos os anos, os Msibi fazem romarias para ir fazer rezas e feitiçarias ao pé do seu precioso manjolo. Mistiquisses à parte a verdade é que todos os que tentaram explorar ou alterar o charco (incluído uma equipa de mergulhadores ingleses e um operador de uma giratória que tentava abrir uma vala para tirar água) morreram. Facto é que a região em redor do manjolo se mantém completamente virgem embora estejamos perto da cidade e a toda a volta (com a devida distância) haja construções (safa, está cá uma trovoada lá fora agora…).
Outro facto é o curioso desvio que o rio faz para se afastar do pântano… o rio parece desviar-se desafiando a gravidade só para fugir do manjolo mystery pond…

É tão diferente a cultura africana… clãs, crenças místicas fortíssimas (ainda existentes), etc… conhecendo, mesmo apenas uma pontinha, da verdadeira cultura africana é fácil compreender porque há tanta dificuldade em adoptar o sistema que os colonizadores tentaram implementar e que quando viram que não era fácil abandonaram deixando este continente imerso na confusão… Há diferenças enormes… no sistema tradicional africano, um rei (diferente do monarca europeu) para ser rei tem de cumprir várias condições (está uma trovoada que me encandeia e faz tremer a casa… safa…) e ser apontado por um grupo de sábios variados. O antigo rei tradicional africano governava em conjunto com os conselheiros e também em conjunto com a pessoa que ele respeitava acima de tudo, a sua própria mãe. O novo líder africano, consegue chegar a presidente de um dia para o outro (metaforicamente falando claro) à força através de um golpe militar, mantém-se no poder através de eleições traficadas e cedo se torna um ditador cujo único objectivo é comer o máximo sem respeito pelo povo…
Nós introduzimos a democracia, mas não a ensinamos em condições nem demos (porra… os vidros abanam todos… mando cada salto da cama…) tempo suficiente para esta malta maturar a ideia… o resultado tem se visto nas ultimas décadas… Será que era assim tão difícil compreender que esta sociedade assentava em princípios completamente diferentes? Valores e crenças diferentes? E viviam assim há milhões de anos em alegria e paz (fora a ocasional e natural pega com o vizinho por causa de terras…).
Não condeno os pequenos que vieram para África fazer o melhor que podiam para tentar desenvolver esta região. Condeno os estrategas, os que decidiram avançar com uma “civilização” que impunha tudo de novo em vez de encontrar um novo equilibro juntando o melhor de dois mundos… como disse um dia o sábio rei Sobhuza II da swazi: “um piano só toca bem quando são utilizadas as teclas pretas em conjunto com as brancas.”. Enfim… tenho de continuar a amadurecer esta ideia.

Continuando com o tour à verdadeira swazi, o andrews leva me de seguida à Msunduza, um bairro tipo favela (onde os mulungos não se aventuram sem estar acompanhados de alguém local e influente) e mostra-me a casa onde o Samora Machel e o seu amigo mais novo, o Guebuza (actual presidente de Moçambique) estiveram escondidos dos tugas pelas suas ideias revolucionárias.

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