Wednesday, July 12, 2006

Colombo, revisto e alterado! por: elisa santos

“Porque é que um ovo posto a girar na horizontal acaba por ficar de pé?” Assim começa o artigo que revela que dois cientistas – um matemático inglês e um físico japonês – explicam o segredo. Segundo a revista, a fricção é a chave do mistério. “A energia do ovo em movimento traduz-se numa força horizontal que puxa o ovo para a posição vertical” e, continua dizendo, “é preciso haver uma certa derrapagem entre o ovo e a superfície. (…)irregularidades na superfície fazem com que o ovo dê saltinhos que acabarão por pô-lo de pé.” Não fala o artigo do que acontecerá se o atrito for demasiado. Pode contudo adivinhar-se. Quebra-se o ovo, perde a forma e não poderá voltar a rodar, correndo mesmo o risco de, assim danificado, vir a apodrecer.

Sinto-me um ovo que gira frenético. Saltito, eu também, nas diferenças que vão atritando a minha casca. Roça o clima e a paisagem na minha pele e há um ardor que me diz da estranheza do corpo. Roçam também os olhos frente a peles de outras colorações, a outros hábitos de manejar os hábitos, as salivas e as palavras. Em todo este atrito o sobressalto é a única constante. Esta dança, uma espécie de polka russa, tem o ritmo do coração. Avanços e recuos fazem os dias da entrega a que muitos chamam inculturação. Se o ovo chorasse, será que lhe veríamos lágrimas de inquietude, de insegurança e de vertigem? Depois de estar em pé, será que o assolam as saudades do outro tempo, da anterior postura? Das invisíveis cicatrizes que ficam na casca do ovo não falam os cientistas, mas quando me detenho com mais cuidado na observação da minha pele, encontro-lhe uma cartografia diferente da que havia antes de começar este bailado que, parecendo um solo, está povoado de corpos.

“Mas porque é que uma equipa de cientistas, cada um em seu ponto do globo, passaria pelo menos quatro anos de volta de um ovo cozido?” Estudo da dinâmica dos corpos em movimento, das condições em vácuo, da microgravidade… Creio que se esconde, por timidez ou decoro, a verdadeira razão. A de derrotar a teoria de Colombo e admitir que descobrir um Novo Mundo é mais que uma travessia. É um desassossego. Não se pode pegar num ovo, achatar-lhe uma das pontas e dizer que está em pé. É preciso que ele roce, raspe e se entregue ao movimento, intenso e certo, para que enfim se erga. Terá contudo que ser um ovo cozido (curtido já por algumas efervescências e ebulições!), caso contrário “o líquido no seu interior absorverá a energia, evitando assim que ascenda”. Assim dizem os cientistas.

1 comment:

mulato said...

AMO este texto que a minha amiga elisa escreveu para a revista dos leigos para o desenvolvimento e me deixou publicar também no meu blog!
Acho q é uma questão de identificação...

Estavas cá com uma inspiração muana...


R.